14/09/2008

Cineasta carioca abusa de nu feminino mas nega filme erótico

VENEZA - Importante em toda a cinematografia de Julio Bressane, a referência da pintura clássica e seu jogo de luz e sombra é mais uma vez elemento fundamental em A Erva do Rato, o novo filme do diretor, apresentado na segunda-feira fora de competição em Veneza.
- Para mim, o princípio de um filme é a luz, mesmo antes de existir o roteiro, os atores, a direção- disse Bressane, numa entrevista marcada por citações intelectuais, como costuma fazer em seus debates.
O cineasta explicou que neste caso há uma lembrança do pintor italiano barroco Caravaggio, habitual em seus filmes, mas principalmente do francês Édouard Manet, um pré-impressionista, e de forma específica, de seu famoso quadro Le Dejeuner sur l'Herbe.
Também comparecem como inspiração as representações da cena mitológica grega do julgamento de Paris.
- Acredito que essas referências pictóricas são uma máscara de papelão, e meu interesse é o que surge atrás delas, que não deixa de ser outra máscara- complementou o cineasta, sob o olhar atento do diretor do festival, Marco Mülller, raramente presente nesses encontros com a imprensa.
A Erva do Rato nasceu, segundo Bressane, de engramas - traços e estímulos nos neurônios - de dois contos de Machado de Assis, A Causa Secreta e Um Esqueleto. Dessa junção, surge o personagem de um homem (Selton Mello) que acolhe uma jovem (Alessandra Negrini) desmaiada no cemitério e cultiva com ela a formação literária e depois passa a fotografá-la nua, obsessão dividida apenas com a perseguição a um rato.
Presente à entrevista, Alessandra Negrini comentou seu segundo trabalho com Bressane, depois de Cleópatra.
- É muito prazeroso para um intérprete trabalhar com um autor como ele. Meus ouvidos estão sempre atentos ao que ele tem a dizer, o que é sempre algo importante, uma viagem a um universo muito particular- comentou a atriz.
O título do filme refere-se a um veneno indígena.
- O que me interessou nessas duas histórias é o horror que o homem tem do rato e do esqueleto, da simbologia que nasce dessas duas figuras- pncluiu Alessandra.
Para Bressane, o rato na simbologia ocidental significa a morte, o tempo e o apetite sexual. Apesar de exibir com freqüência na fita o órgão sexual feminino, Bressane negou ao ser questionado se era um autor erótico.
- O que você acha bonito é o que te dá prazer; todo mundo vai à procura da beleza e do gozo sexual- disse Bressane.
A adaptação de Machado de Assis não é novidade na trajetória de Bressane, que assumiu no passado o risco de filmar Memórias Póstumas de Brás Cubas. Mas ele acredita que há Machado em muitos de seus filmes.
- Machado é um inventor da língua portuguesa, na verdade um re-inventor da prosa e da lírica, e seu estilo já sugeria nos anos de 1800 imagem, ou seja, cinema- disse o Bressane.
O diretor lembrou ainda que ao final da fita, já nos créditos, ele adicionou algumas cenas de making of como referência ao hábito de Machado de conversar com o leitor.
- É uma espécie de posfácio- explicou.
Bressane negou ainda que seu cinema seja um teatro filmado, relação costumeira feita com seus filmes.
- Não é porque tem um plano fixo e longo que é teatro filmado; teatro para mim é o que era feito antes da encenação de salão, aquela feita no espiritismo, por exemplo, na umbanda- concluiu o diretor.

Fonte: Portal Terra

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